Ariano Suassuna, esse patrimônio cultural da Paraíba, falecido em Recife em 2014, aos 87 anos, tem alguns episódios característicos de sua irreverência, sua marca indelével. Um deles custou-lhe uma noite no xadrez.

Em 1948, ainda bem jovem, Ariano saiu do Teatro Princesa Izabel, no Recife, com três amigos. Puseram-se a conversar sentados no parapeito da ponte Duarte Coelho. Noite alta, Recife deserta e o rio Capibaribe limpo e convidativo.

– Vamos tomar um banho? – sugeriu um deles.

Um foi sorteado e ficou encarregado de guardar as roupas; os outros três jogaram-se dentro do Capibaribe, o “Cão Sem Pluma” de João Cabral e Melo Neto. Completamente nus!

So esqueceram de um detalhe: ali pertinho ficava a Secretaria de Segurança Pública de Pernambuco, a rígida “Sorbonne” da Rua da Aurora.

Terminada a “traquinagem”, ao subirem nus, tremendo de frio, um camburão da Polícia já estava estacionado para recepcioná-los.

Todos se identificaram e Ariano entregou uma carteira de estudante. A partir daí, travou-se o hilário diálogo entre ele e o delegado, bem retratado por Chico Maria na sua coletânea dos programas do Confidencial:

O delegado:

– Ariano Suassuna…o que o senhor é do doutor Saulo Suassuna?

– Sou irmão.

– É uma das melhores famílias de Recife e o senhor tomando banho…

– E o senhor não toma banho, não?

 – Mas, nu?

– E o senhor toma banho vestido?

O delegado recrudesceu:

– Bem, eu ia soltar vocês, mas como estão muito metidos a engraçadinhos, vão passar a noite presos.

E assim Ariano curtiu sua primeira e única noite no xadrez. Não pelo banho, mas pela irreverência, uma de suas marcas.